sexta-feira, 3 de julho de 2009

A MANILHA VAI SECA (44): O Santana de Sócrates e a arte de deitar bombons para o lixo

Lembram-se do célebre dia em que Pedro Santana Lopes comparou o seu Governo a um bebé na incubadora, que, impiedosamente, levava murros e estalos dos irmãos mais velhos? Foi esta a infeliz metáfora (ou seria comparação?) que fez verter o copo da paciência de Jorge Sampaio, que, sem mais rodeios, dissolveu a Assembleia da República e convocou novas eleições. Se tivesse sido esse o único disparate de Santana, Sampaio ainda fechava os olhos e engolia em seco, mas o menino-guerreiro já tinha feito muitas diabruras e a paciência presidencial tem limites.

Já perceberam onde quero chegar, certo?

Manuel Pinho foi, na verdade, o Santana deste Governo, o homem que passou quatro anos e meio a fazer graçolas e a dizer as maiores alarvidades, sempre com Sócrates a engolir em seco e a fingir que nada se passava. Dizem as más-línguas que, quando Pinho tentou vender aos chineses a ideia de que Portugal era um país de mão-de-obra barata, Sócrates estaria capaz de lhe apertar o gasganete. É uma pena que não o tenha feito na altura, confesso. Mas está tudo bem, já passou.

Até ao dia.

Os cornos de Manuel Pinho para Bernardino Soares mais não foram do que a enésima falta de educação que os portugueses tiveram a oportunidade de presenciar naquela tabanca instalada no Palácio de São Bento. A diferença é que Pinho já não tinha margem de manobra para mais uma graçola destas, em especial depois da infelicíssima tirada da papa Maizena (que muito ajudou Paulo Rangel a tornar-se conhecido junto da população em geral, diga-se em abono da verdade). Ainda que as críticas de Bernardino Soares fossem profundamente injustas e Pinho tenha dado tudo por tudo para salvar as minas de Aljustrel, nada justificava o fatal gesto dos cornos no órgão máximo que simboliza a democracia portuguesa.

Não sei se foi Pinho a pedir a demissão ou se foi Sócrates que o pôs a andar, mas isso pouco ou nada interessa. Foi o fim da linha, o ponto final, a morte política do menino-guerreiro deste Governo.

Todo este episódio acabou por favorecer a oposição de uma forma que, decerto, ninguém poderia imaginar. Sendo o debate sobre o Estado da Nação o derradeiro embate de José Sócrates na Assembleia da República durante a actual legislatura, tudo teria de correr pelo melhor, de forma a passar a melhor imagem possível para o eleitorado descontente e/ou com dúvidas.

Como é seu apanágio, Sócrates preparou-se bem para o debate e levou na manga alguns trunfos para jogar. Para adoçar a boca dos portugueses e calar as bocas da oposição, o mestre da ilusão jogou um reforço de 115 milhões de euros da dotação para a construção de novos equipamentos sociais, a criação de uma linha de crédito de 50 milhões também para esta área e a promessa (mais uma) de que o programa nacional de requalificação e modernização dos centros de saúde e urgências hospitalares teria, este ano, uma comparticipação adicional de 20 milhões. Com os cornos de Manuel Pinho, os bombons foram todos para o lixo e quem se lixou foi o próprio Sócrates, já que as medidas/promessas que apresentou perderam toda a visibilidade em favor de um par de cornos.

Se eu fosse José Sócrates, dava uma carga de porrada a Manuel Pinho até o deixar estendido no chão. Vai na volta, Sócrates até conseguiria reconquistar uma boa fatia do eleitorado se optasse por partir para a ignorância, já que estaria a satisfazer a vontade de 10,7 milhões de pessoas (incluindo ele próprio).

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