segunda-feira, 27 de julho de 2009

JOKER (8): Senhor deputado, o senhor deputado sabe, senhor deputado, que eu também vou ser senhor deputado, senhor deputado

Minhas amigas e meus amigos, minhas senhoras e meus senhores.

Venho, por esta forma, comunicar-vos, a título puramente oficial e em primeiríssima mão, que um ilustre partido político português, cujo nome não vou revelar, endereçou, à minha douta pessoa, um honroso e mui estimado convite para integrar as suas listas de candidatos a deputados à Assembleia da República. Trata-se, sublinho, de um lugar perfeitamente elegível, com a ressalva de, caso o partido em questão vença as Eleições Legislativas, eu poder receber novo convite, desta feita para ocupar um qualquer lugar no novo Governo que nascerá dos resultados do sufrágio popular de 27 de Setembro.

Perante tão elogioso convite endereçado à minha genial, divina e modesta pessoa, confesso-vos que, numa primeira fase, me senti inclinado a declinar tão maravilhosa proposta, ainda para mais, feita por um partido de enormes pergaminhos na defesa da democracia e do bem-estar dos portugueses. Bem sei que a deusa Fortuna está cega e surda para as minhas preces e que a minha alma se arrasta por centros de emprego fétidos e imundos, mas senti que, em Portugal, haveria gente ainda menos qualificada do que eu para ocupar um lugar na Assembleia da República, o local onde se sentam os representantes da vontade do povo. Contudo, deitando ambos os joelhos por terra, um ilustre representante do citado partido implorou para que aceitasse. “Tu és o mais douto, os mais brilhante, o mais sábio de entre todos os que se julgam doutos, brilhantes e sábios”, disse-me o dirigente, com a face molhada em lágrimas.

Decidi então aceitar. Mas jurei a mim mesmo que, nos próximos meses, iria trabalhar com afinco para estar ao nível dos deputados da Nação, o que, sei-o bem, me obrigará a um substancial esforço até poder estar entre os piores. E para vos provar que estou mesmo apostado em me tornar um verdadeiro eleito digno de ter o meu lugar no célebre hemiciclo do Palácio de São Bento, anuncio, desde já, que, no próximo mês de Agosto, ao invés de ir a banhos, irei estar deitado numa mesa de operações para proceder à amputação de metade do meu encéfalo e à remoção integral da minha coluna vertebral.

Diante do espelho, ensaio já as minhas falas.

- Se o meu partido perder as Legislativas e for para a oposição: “Senhor primeiro-ministro, o senhor primeiro-ministro sabe, senhor primeiro-ministro, que o senhor primeiro-ministro está a mentir, senhor primeiro-ministro, porque aquilo que o senhor primeiro-ministro disse, senhor primeiro-ministro, não é verdade, senhor primeiro-ministro. O senhor primeiro-ministro disse uma coisa na semana passada, senhor primeiro-ministro, mas agora, senhor primeiro-ministro, o senhor primeiro-ministro vem dizer justamente o contrário, senhor primeiro-ministro. Em que é que ficamos, senhor primeiro-ministro?”

- Se o meu partido vencer as Legislativas e formar Governo: “Senhor deputado, o senhor deputado sabe, senhor deputado, que aquilo que o senhor deputado diz agora, senhor deputado, é o contrário daquilo que fez quando o seu partido estava no Governo, senhor deputado. Um dia, senhor deputado, o senhor deputado diz uma coisa, senhor deputado, mas, quando são os outros a dizer o mesmo, senhor deputado, o senhor deputado vem e diz o contrário, senhor deputado. O senhor deputado, senhor deputado, é que está a mentir aos portugueses, senhor deputado, e o senhor deputado sabe, senhor deputado, que não está a dizer a verdade, senhor deputado. Porque este Governo, senhor deputado, é um Governo que faz, senhor deputado, ao contrário do seu Governo, senhor deputado, que deixou o país de tanga, senhor deputado e o senhor deputado faz essa cara mas sabe que é verdade, senhor deputado.”

Contudo, quero aqui salientar que, apesar de ter aceite um convite que me irá guindar para a Assembleia da República e, quiçá, até mesmo para um cargo ministerial, jamais deixarei de ser a mesma pessoa que todos conheceram. Jamais me deixarei corromper, seja no que for, e sempre pautarei a minha acção e palavras, seja neste blog, seja no dia-a-dia, pela isenção, pela justiça, pela verdade. A propósito, já vos disse que ainda está para nascer um primeiro-ministro que faça mais por Portugal do que José Sócrates?

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