O PS de José Sócrates transformou-se num partido dominado pela ganância do voto. Tal é o voraz apetite por votos que tudo vale para encantar eleitores incautos, porventura tomados por asnos pelas gentes que dirigem o quartel do Rato.
Socialista de nome, o PS transformou-se naquilo que, certa vez, denominei de «partido plasticina». Basicamente, a estratégia do partido de José Sócrates será, a partir de uma posição central, tentar moldar-se aos gostos de todos os eleitorados e potenciais votantes, bem como aos interesses internos e secretos que pululam lá para os lados do edifício cor-de-rosa que fica perto das Amoreiras.
Numa hora, o PS pertence a uma esquerda livre e moderna (estilo BE), apoia a legalização do aborto até às 20 semanas e já fala no casamento entre pessoas de outro sexo. Noutra hora, Vieira da Silva vem a público admitir que poderá ter de reduzir drasticamente a entrada de imigrantes em Portugal, dando razão a Paulo Portas e ao seu CDS-PP. A seguir, temos a nacionalização do BPN, num reviver dos velhos tempos do PREC e dos dias em que o PCP até achava que era a maior força política portuguesa. Ao lado, com o BPP, temos um Estado mínimo e neoliberal (semelhante a muitos sectores do PSD), que apenas legisla e faz cumprir as leis, mas que não interfere no poder auto-regulador da economia (e os clientes do BPP que se lixem, pois claro). No meio de tudo isto, temos inúmeras interferências na actuação dos media, quase fazendo lembrar os tempos do lápis azul e da União Nacional. Pelo meio, temos um Estado social (o sonho de vários sectores do PSD e do PS) que distribui subsídios e apoios para ajudar as famílias em dificuldades com a crise. Logo a seguir, regressa o neoliberalismo mais cru e a selvajaria de mercado, com banca e gasolineiras a fazerem o que lhes dá na real gana.
No meio desta plasticidade ideológica, veio a escolha do cabeça-de-lista para as Eleições Europeias. Ao invés de apostar numa figura do aparelho, José Sócrates optou antes por um académico de Coimbra outrora ligado ao PCP, mas hoje rendido aos ideais socialistas (supostamente, os do PS). Com esta jogada, Sócrates tentou manter o seu eleitorado (que se diz de esquerda, embora não faça a mais pequena ideia do que tal possa significar), ao mesmo tempo que aposta num homem que, pela sua proximidade à esquerda mais radical, poderia travar o avanço da CDU e do BE. Ainda por cima, aquele arzinho de Avô Cantigas de Vital Moreira despertava, inicialmente, uma simpatia automática pelo cabeça-de-lista rosa.
Sócrates foi ganancioso e, numa altura em que julgava o PSD moribundo (em Fevereiro, a contestação a Manuela Ferreira Leite era mais do que muita) e o CDS-PP morto, partiu à conquista dos votos das duas áreas que ainda não tinha devorado.
Mas a ambição perde muita gente.
Vital Moreira era tido como um orador brilhante nos seus tempos de PCP, mas essa chama perdeu-se com um certo afastamento da política. O douto senhor de Coimbra (que é muito menos douto do que o Doutor Mento de Lisboa) até tem uma certa inclinação para discutir assuntos de índole europeia e, em certas matérias, até consegue falar de temas de Eleições Europeias na campanha para as Eleições Europeias.
Contudo, Vital tem também uma tendência nata para o insulto fácil, para a crítica disparatada e para acusações bizarras, como a de ligar o caso BPN a todo o PSD, quando o mesmo envolve apenas alguns antigos governantes do partido. Aliás, a ligação do PSD ao BPN é uma estratégia suicida de Vital Moreira (o eleitorado não é estúpido e percebe a covardia de ligar este caso a todo um partido com largos milhares de militantes e votantes), que, ainda por cima, está a dividir o PS em dois, já que há quem se desmarque de tais acusações e há quem as apoie e incentive (por exemplo, o inenarrável Augusto Santos Silva, figura da qual Vital se deve distanciar a todos os níveis se quiser ter um resultado decente no dia 7).
A tudo isto junta-se ainda um discurso que mescla uma defesa exacerbada do PS e do Governo (por vezes, raiando os limites do absurdo) e uma dissonância de posições entre Vital e o partido que o apoia (por exemplo, na recondução de Durão Barroso). Pelo meio ficou o incidente do 1.º de Maio, que não afastou o eleitorado do PCP do PS, mas sim demonstrou que comunistas e simpatizantes não aceitam pôr a cruz no novo partido de Vital Moreira.
Muito mais haveria a dizer de Vital Moreira, que, apesar de um ou outro bom momento na campanha, foi um tiro no pé de José Sócrates, que, ganancioso, arrisca-se a perder tudo. Acima de tudo, o primeiro-ministro necessitava de uma Rei de Copas que, pese embora algumas opções do Governo, dissesse ao eleitorado: “Vejam, ainda somos um partido de esquerda”.
No final, saiu-lhe um Duque de Paus trauliteiro e quezilento (e muito pouco hábil do ponto de vista político), que, neste momento, já perdeu até a simpatia que tinha graças às parecenças físicas com o lendário Avô Cantigas.
Por isso, se querem saber a minha opinião, estas eleições vão marcar um novo fôlego para o PSD, que, mesmo sem um candidato do outro mundo, não cometeu, nesta campanha, erros de palmatória como os de Vital Moreira (e, já agora, de Ana Gomes). Não sei se o PSD conseguirá ultrapassar ou igualar o PS no dia 7, mas acredito que vai aproximar-se mais do que muita gente esperaria há alguns meses.
Todavia, esta aproximação do PS não deve ser entendida como um cartão vermelho ao Governo de José Sócrates, mas sim como um «chumbo» ao candidato Vital Moreira, o professor de Coimbra que, segundo algumas notícias, faz de tudo menos ser professor. Por conseguinte, que o PSD não se iluda com os resultados de dia 7, porque, em campanha pura e dura para as Legislativas, José Sócrates é um osso muito mais duro de roer do que o Avô Cantigas de segunda categoria que o secretário-geral do PS foi desenterrar para estas Europeias…
Sócrates de novo
Há 1 hora
1 comentário:
Gostei do seu discurso Dr. Mento! Esse senhor nunca me enganou.
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