quarta-feira, 6 de maio de 2009

ESPADAS QUE PICAM (3): Consequências ocultas do desemprego (II Parte)

(O tema segue novamente sério)

Num post anterior, discorri sobre a ligação entre o desemprego, a depressão e a autodestruição, uma tríade que, em casos extremos, pode mesmo conduzir ao suicídio. Desta vez, abordo o tema por outro ponto de vista, embora directamente ligado.

Onze em cada dez vezes que fala sobre educação, José Sócrates faz questão de sublinhar a importância da qualificação para o futuro económico e social do País. Até aqui, nada de mais a apontar. Pelo menos, à ideia genérica em si.

Mas como espera José Sócrates que este desiderato se cumpra, se as condições a tal não são minimamente propícias?

Passo a explicar: Quando o desemprego chega a um agregado familiar, as consequências nefastas fazem-se sentir de imediato. O rendimento disponível é menor, o consumo retrai-se, a depressão toma conta do membro que perdeu o seu posto de trabalho, a sua forma de sustento e, muitas vezes, a sua própria identidade numa sociedade que privilegia de sobremaneira o indivíduo enquanto ser trabalhador. Ora, este cenário é perfeito para que as tensões dentro do agregado familiar comecem a despontar, podendo mesmo formar-se um clima verdadeiramente de fugir. Em muitos casos, o divórcio acaba mesmo por ser a única saída possível.

Lá diz o ditado popular: “Em casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão”.

O problema é que, num agregado com crianças ou jovens em idade escolar, este clima de tensão, insegurança, incerteza e falta acaba por ter repercussões negativas no rendimento escolar. De súbito, jovens que até tinham bons resultados, começam a deixar de ter boas notas, podendo mesmo perder anos… ou, quiçá, abandonar de vez a escola perante a frustração de terem sido inteligentes até uma dada altura e, de repente, terem ficado burros por milagre. Mas não há milagres: Tudo reside na qualidade do ambiente familiar.

Com a taxa de desemprego (registado) a atingir dois dígitos, este fenómeno poderá ganhar proporções bastante graves, ainda que seja totalmente ignorado pelo poder político. Numa conjuntura em que o mercado de trabalho se mostra totalmente incapaz de absorver os milhares e milhares de pessoas que perdem o seu emprego, certo é que muitos sentirão uma sensação de desespero ainda maior, como se, de repente, o futuro fosse um horizonte nebuloso sem perspectivas de um raio de sol. E este sentimento de falta de perspectivas vai, claro está, influenciar (ainda mais) negativamente o ambiente familiar, levando a tensões ainda mais acesas…

E está feito o efeito bola de neve.

Com tudo isto, milhares e milhares de alunos potencialmente brilhantes poderão perder-se nas teias do insucesso escolar. Muitos seriam, em potência, grandes engenheiros (mas não com cursos da extinta Universidade Independente), brilhantes investigadores, laboriosos médicos. Agora, condenamo-los a um futuro bem menos brilhante. Quem sabe até se não será um futuro na marginalidade.
Com isto, condenamos um País à mediocridade. Apenas porque não sabemos fazer uma leitura mais profunda de cada fenómeno, limitando a nossa capacidade de análise a frias estatísticas que mais não são do que abstracções.

Pede-se, pois, ao poder político que deixe de fazer bluff e passe a olhar com atenção para as cartas que tem na mão.

1 comentário:

SILÊNCIO CULPADO disse...

Dr.Mento

Pois o efeito da bola de neve é bem visível nas situações de desemprego. Porém vou realçar apenas um aspecto relacionado com a qualificação e que muito me tem dado que pensar.
Acho que seria interessante que fosse feito um levantamento com vista a conhecer quais os licenciados que estão no desemprego, ou em caixas de hipermercado, e os cursos que tiraram, as Universidades onde os tiraram e as classificações que obtiveram. Depois fazer idêntico levantamento em relação a quadros superiores que estão bem colocados. E, por último, identificar a origem de classe duns e doutros.
Se calhar chega-se à conclusão que valem mais os cursos da Independente com 10 valores.
E quanto ao desemprego... subentende-se, não?


Abraço