terça-feira, 12 de maio de 2009

ESPADAS QUE PICAM (4): Consequências ocultas do desemprego (III)

(Esta é a última parte)

O desemprego é, em si, um tumor na sociedade. Destrói pessoas, economias, sistemas de segurança social, famílias, carreiras e até governos. É o sinal mais óbvio de uma crise económica e financeira que começa com o colapso do crédito de risco norte-americano. Mas é também o sintoma da crise que demorará mais tempo a sarar.

Quando as economias começarem novamente a recuperar, todas as peças voltam, aos poucos, ao seu lugar. A forma como tal irá, de facto, acontecer, é uma incógnita - se alguém a conhecesse, decerto que já a teria aplicado. Seja como for, chegaremos a um ponto em que as economias vão voltar a crescer, tal como o consumo, o que vai obrigar muitas empresas a contratar novos trabalhadores. Neste ponto, o desemprego vai cair, mas…

Será que vamos ter novamente empregos de qualidade, capazes de realizar, estimular e satisfazer as pessoas que os ocupam?

Pois, é aqui que reside um dos problemas mais complicados. Uma crise como aquela que estamos a atravessar cria uma enorme bolsa de mão-de-obra (qualificada ou não) que, de repente, fica disponível. Durante um certo período de tempo, estes desempregados (ou parte deles) têm acesso ao subsídio de desemprego, mas esta prestação é atribuída apenas durante um dado número de meses. Quando termina esse período (um ano e meio, ao que julgo), há quem se veja privado de qualquer fonte de rendimento.

Perante a possibilidade de não terem sequer como encher o frigorífico, muitas pessoas vão ter de aceitar aquilo que o mercado de trabalho lhes quiser oferecer. Por exemplo, um emprego anteriormente remunerado com mil euros por mês, pode ver o seu valor reduzido para 500 euros… mas vai haver quem esteja desesperado o suficiente para aceitar. Os empregadores, na sua maioria, têm consciência dos dramas causados pelo desemprego e não têm qualquer pejo em aproveitar-se de situações familiares verdadeiramente lamentáveis.

Muita gente vai perder poder de compra com o fim da crise, já que certos novos ordenados de novos empregos serão inferiores até ao próprio subsídio de desemprego.

Para muitos portugueses, a retoma da economia é vista como uma luz ao fundo do túnel, um sonho quente numa noite glaciar, um trunfo escondido que permita fazer aquela vaza decisiva à sobrevivência do jogo. Mas, quando o tal trunfo não conseguir mais do que apanhar duques, ternos e quadras, a desilusão irá instalar-se nas mentes de milhares e milhares de pessoas, que, de súbito, tomam consciência de que mais não são do que meros peões no xadrez da economia global.

Há quem acredite que a crise económica e financeira pode trazer consigo convulsões sociais como há muito não se via, levando mesmo à queda de governos, partidos e até regimes políticos. Todavia, o fim da crise é que poderá ser, afinal, o momento do despontar de novas ondas de conflitualidade social.

4 comentários:

R.Almeida disse...

É extremamente pertinente este tema sobre o desemprego.
A agressividade dos grandes grupos financeiros e a procura incessante por lucros cada vez maiores bem como o incentivo ao consumo e à utilização de créditos levam ao empobrecimento do povo detentor do tecido produtivo encontrando assim a fórmula mágica para a nova escravatura do séc. XXI .
Quando se apercebem que a pobreza reduz o consumo e leva ao colapso das economias formam estratégias de distribuição de riqueza e baixam as margens de lucro, não sem antes prepararem o terreno para que os bens de primeira necessidade sejam produzidos por eles e assim o rio de ouro encher os seus cofres de novo estabelecendo um equilibrio entre as grandes fortunas.
As crises só acontecem devido à ditadura económica dos senhores da "Grana",que sobrevivem à custa dos neo-escravos, sem que governos e entidades reguladoras estabeleçam um tecto para o valor máximo dessas fortunas, o qual ao ser atingido deveria ser utilizado em favor daqueles que produzem e geram riqueza, através de serviços e beneficios que levassem a uma melhor qualidade de vida dos povos.

Maria Emília disse...

O seu comentário é bastante pertinente e necessário.
Ainda hoje passei à porta do Centro de Emprego em Sintra, ainda não eram 8 horas da manhã. A fila de pessoas à espera era de mais de 200 metros. Fiquei impressionada. Como sempre tento ver o outro lado pensei que se aquelas pessoas estavam ali, ajgumas certamente com bastante sacrifício é porque ainda há uma réstea de esperança e isso é o suficiente para inflamar o mundo. Posso ser utópica mas creio que vai dar-se uma volta e o desemprego irá começar a dimunuir.
Teremos todos que estar atentos a esta situação e isto que estamos fazendo, falar do assunto, já é uma ajuda.
Um abraço,
Maria Emília

SILÊNCIO CULPADO disse...

Dr.Mento
O meu amigo Raul pôs o dedo na ferida no comentário que fez.
Infelizmente não é possível inverter esta situação de forma pacífica.E isto porque as novas tecnologias reduziram substancialmente empregos na área administrativa e puseram em causa muitos saberes a nível mais qualificado.
A reformulação do tecido produtivo, face às novas necessidades, implicaria uma maior justiça nos recrutamentos e na formação dado que uns e outros pertencem às elites que nos comandam. Também os aproveitamentos desse exército de mão-de-obra disponível, e que faz cair o preço do trabalho, serão feitos de forma desigual consoante a inserção sócio-económica dos desempregados.
Quem mais precisa estará sempre em maior desvantagem. Por tudo isto não auguro retomas nos tempos mais próximos e penso mesmo que só com uma rotura completa se pode dar início a um novo ciclo.


Abraço

Susana Falhas disse...

Dr Mento:
O desemprego é uma triste e dramática realidade .
Eu vivi essa angústia muito antes dessa crise arrebentar...há 10 anos, quando saí da faculdade.Durante esse tempo, apenas consegui trabalhar 4 anos, como professora. E cheguei à conclusão que não podia continuar assim. Decidi mudar de vida, e aventurar-me como empresária...que está a dar os primeiros passos ...em plena crise.

São tempos difíceis para recomeçar, seja de que modo for, mas há que ter a coragem para fazer alguma coisa e não estar à espera que o subsídio acabe...e daquele emprego de sonhos. Mais do que nunca não podemos dar-nos ao luxo de ficarmos parados à espera. É preciso fazer alguma coisa, mesmo que signifique ganhar menos ...ou até mesmo nada ( como é o meu caso, neste momento).

Gostei do teu blog e vou segui-te.

Fico agora a aguardar pela tua inscrição para a blogagem colectiva:
email- aminhaldeia@sapo.pt

Um abraço, Susana